sábado, 8 de janeiro de 2011

Pensamentos do Pe José Comblin

No século XIX, em plena ascenção da modernidade e do iluminismo, um ilustre pregador francês, que refundou a Ordem Dominicana na França, o frei Lacordaire, considerado um dos homens mais progressistas na Igreja daquele tempo, inaugurou a famosa tradição dos sermões de quaresma em Notre Dame de Paris. A cada domingo da quaresma um pregador ilustre era encarregado de tratar de um tema da atualidade. O primeiro foi Lacordaire, também conhecido por seu grande talento de oratória.
Falando da Igreja em meio a um mundo em plena ebulição, Lacordaire afirma que ela “mole sua stat!”, ou seja, a Igreja sustenta-se pela sua inércia.
A Igreja está em pé graças à sua massa. Ela é como uma massa inerte, como uma pedra inerte que resiste a todas as pressões, a todas as vicissitudes da mundo. A sociedade estava em plena mudança, mas a Igreja permanecia imutável, firme na sua massa inerte. Essa era a convicão unânime protagonizada pela figura mais proeminente da Igreja daquele tempo, quando a França era o maior país católico da cristandade. De onde podia emergir esse pensamento ? Da filosofia grega integrada na teologia católica oficial, ou seja, a teologia da hierarquia.
A presença do Ser como eixo principal do pensamento católico somente podia agradar às classes dirigentes da sociedade, que sentiam o apoio da Igreja nas suas lutas contra quarquer tipo de revolução ou de mudança.
A concepção do Deus como ser supremo, o permanente, o imutável. A eternidade imutável de Deus gera uma religião conservadora. Esta teologia foi influenciada pelos filósofos gregos. Toda mudança será vista como desordem, como desobediência ao Criador, que criou as coisas para que sejam estáveis, cada um seguindo a sua natureza. O ideal humano por excelência é a ordem. De fato, durante toda história da cristandade, o conceito de ordem esteve no centro da teologia. A teologia dogmática mostra a ordem do universo, e a moral mostra como se deve agir para manter a ordem. O bom é o ordenado.
Até hoje a Igreja romana, especialmente na Europa, não conseguiu e não quis se libertar desse conservadorismo. Tornou-se guardiã da ordem. Constituiu-se em firme apoio aos partidos conservadores, tolerando somente alguns movimentos progressistas de católicos, mas com muitas reservas. Isso explica por que toda mudança é considerada perigosa, uma ameaça à identidade do cristianismo.
Trecho do livro “A vida – Em busca da liberdade”